Um ritual de um povo indígena brasileiro, voltado para "manter a ordem
social e cósmica", foi indicado para integrar uma lista de patrimônios
culturais imateriais "em necessidade urgente de proteção" elaborada pela
Unesco, a agência da ONU para a educação e a cultura.
O yaokwa é a principal cerimônia do calendário ritual dos enawenê-nawê,
povo indígena cujo território tradicional fica no noroeste do Mato
Grosso.
O ritual, que marca o início do calendário enawenê, dura sete meses e
é realizado com a saída dos homens para realizar uma pesca coletiva com
o uso de uma barragem e de armadilhas construídas com cascas de árvore e
cipós.
O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional (Iphan) registrou o ritual Yaokwa como bem cultural em 2010.
Segundo dados da Fundação Nacional de Saúde (Funasa), o povo
enawenê-nawê - que fala a língua aruak - é formado por cerca de 560
integrantes.
A partir desta quarta-feira, a comissão
intergovernamental da Unesco pela salvaguarda do patrimônio cultural
imaterial se reúne em Bali, na Indonésia, para avaliar os rituais e
tradições indicados para ser protegidos. A reunião se encerra no próximo
dia 29.
O Brasil país conta com 18 bens inscritos na lista do Patrimônio Mundial da Unesco.
Entre o patrimônio imaterial, dedicado a
tradições orais, cultura e a arte populares, línguas indígenas e
manifestações tradicionais, estão as Expressões Orais e Gráficas dos
Wajãpis do Amapá e o Samba de Roda do Recôncavo Baiano.
Se entrar na lista, o ritual dos enawenê-nawê passará a contar com apoio da entidade na sua preservação.
Muitas atividades da Unesco estão prejudicadas
desde que os Estados Unidos retiraram o seu financiamento da agência,
depois que ela aceitou a Palestina como Estado-membro pleno.
Seres subterrâneos
Com o ritual Yaokwa, os enawenê-nawê acreditam
entrar em contato com seres temidos que vivem no subterrâneo, os
yakairiti, cuja fome deve ser saciada com sal vegetal, peixes e outros
alimentos derivados do milho e da mandioca, a fim de manter a ordem
social e cósmica.
Para a realização do ritual, os indígenas se
dividem em dois grupos: um que fica na aldeia junto às mulheres,
preparando o sal vegetal, acendendo o fogo e oferecendo alimentos, e
outro que sai para a pesca, com o objetivo de retornar para a aldeia com
grandes quantidades de peixe defumado, que é oferecido aos yakairiti.
Os indígenas realizam a pesca em rios de médio porte da região. Com os
peixes e os demais alimentos, os enawenê-nawê realizam banquetes
festivos ao longo de meses, acompanhados de cantos com flautas e danças.
Indígenas constroem barragem para pesca;
alimentos servem de oferenda (Foto: acervo Iphan)
Encantamento de camelos
Além do yaokwa, outro ritual indicado para proteção urgente na América do Sul é o eshuva, composto pelas orações cantadas do povo huachipaire, do Peru.
A lista de proteção urgente também inclui como indicados a dança saman, da província indonésia de Aceh, as tradições de relatos de histórias no nordeste da China e o "encantamento de camelos" da Mongólia, no qual as pessoas cantam para as fêmeas, a fim de persuadi-las a aceitar os filhotes de camelo órfãos.
Já para a lista representativa de patrimônio
cultural imaterial da humanidade (sem indicativo de necessidade urgente
de proteção), são indicados, pela América do Sul, o conhecimento
tradicional dos xamãs jaguares de Yurupari (Colômbia) e a peregrinação
ao santuário do senhor de Qoyllurit’i (Peru).
Outras tradições indicadas pela Unesco são as
marionetes de sombras chinesas, o kung-fu dos monges Shaolin (China), a
porcelana de Limoges (França), a música dos mariachis mexicanos e o
fado (música tradicional portuguesa).
Fonte: BBC Brasil